segunda-feira, 21 de agosto de 2017

O MEDO DA MORTE NA CONTEMPORANEIDADE *

Numa época em que muito se fala e se vende o fim do mundo, talvez uma reflexão sobre a morte possa trazer alguns elementos fundamentais da reflexão a partir da tanatologia, que busca aprofundar este tema que a todos nos envolve e desafia. Vale a pena a leitura. 

* Este texto é de autoria de Tiago de Souza, graduando do 3º ano de Teologia da Faculdade Católica de Santa Catarina (FACASC).  


A modernidade está imersa em inúmeros avanços científicos e tecnológicos que possibilitam o homem e a mulher aumentarem seus conhecimentos, dominarem diversos recursos naturais, transformando-os em benefício próprio e assim viverem confortavelmente. Entretanto, aumentou o número de pessoas que não conseguem lidar, superar o que é mais próprio seu: os medos, entre eles o medo da morte. Mas o que é a morte? O dicionário apresenta alguns significados comuns sobre a morte: fim, destruição, ruína. Todas essas palavras não expressam situações positivas, mas ocasos ruins para as pessoas. Aí já se encontra uma carga negativa que atualmente a morte tem.

É fato ver que a sociedade ocidental não se questiona sobre a morte, ao contrário, prega e transmite aos seus descendentes uma anticultura da morte. Um exemplo disso são as crianças que hoje não são mais expostas às situações de morte. Antigamente, desde novinhas, cresciam ouvindo sobre a morte, eram colocadas diante da morte, participando de velórios ou dos últimos momentos de vida das pessoas que lhe eram próximas. Hoje é raridade isso acontecer.

O ginecologista e tanatólogo Sebastião Galeno apresenta uma reflexão no mínimo curiosa sobre qual a origem do medo da morte, o qual é no mínimo curioso e se deve dar maior atenção. Segundo ele, a causa está além das aparências, não está no exterior, fora, mas dentro da pessoa. Em outras palavras, o medo está no auto, severo e solitário julgamento que acontece imediatamente após a morte. Assim, a morte abre caminho para a pessoa olhar para si mesma com verdade, pureza e sinceridade, avaliando seus atos em vida, vendo-os se foram dignos de pessoas criadas à imagem do Pai. Durante toda uma existência marcada pela competição, pela busca da sobrevivência e do reconhecimento, muitas vezes, impulsionada por atitudes desonestas para com o outro, e facilmente esquecidas pelas exigências de cada dia, agora, após a morte, vem à tona e não a como fugir.
"O Sepultamento de Atala". Anne Louis Girodet de Roucy Trioson. Óleo sobre tela. 207x267cm. 1808. Musée du Louvre. Paris, France.

Galeno afirma como solução que se deve sair do comodismo e assumir a vida em sua plenitude. Não vê-la só pelo crivo da ciência, que tem seu valor, pois ajuda na sobrevivência humana, mas que é finita e compreende a morte como fim. Mas olhar com a visão do espírito que transcende a materialidade. Isso fará com que o consumismo, o imediatismo, o materialismo, a competitividade, não sejam prioridade. Assim sendo, de acordo com Galeno, a solução está no equilíbrio entre espiritualidade e ciência, pois precisamos viver e administrar bem a matéria, mas também transcendê-la porque ela não resume toda a realidade. Dessa forma, esse medo irá aos poucos se esvaindo, pois a vida será mais bem vivida e o julgamento da consciência não pegará o Homem de surpresa. Então, a morte será tranquilamente compreendida como uma passagem.

Portanto, o medo da morte, mas do que outrora é patente nos tempos hodiernos. Viu-se que como pano de fundo há o drama da solidão, da vergonha e do julgamento último. Uma forma objetiva que pode ajudar a superar ou canalizar esse medo da morte é viver a existência sem encerrar a vida no aqui, no agora, na ciência, nos bens que geram conforto e prazer imediato, mas fazendo uso disso, transcende-los, abrindo-se para a realidade espiritual. Essa atitude dará a possibilidade ao homem e a mulher de alargarem sua existência, permitindo-se acessar o horizonte da esperança. Assim, a morte tem a possibilidade de tornar-se tranquilizadora, libertadora, plenificante, sendo porta para uma realidade maravilhosa.

REFERÊNCIAS

COMBINATO, Denise S.; QUEIROZ, Marcos S. Morte: uma visão psicossocial. Estudos de Psicologia, v.11 no2, 2006. p. 209-216, p. 211. Disponível em:< http://www.scielo.br/pdf/%0D/epsic/ v11n2/a10v11n2.pdf>. Acesso  em: 15 jun. 2017.

GALENO, Sebastião. Medo da morte, medo da vida. In: D´ASSUMPÇÃO, Everaldo A. (Org.). Biotanatologia e Bioética. São Paulo: Paulinas, 2001. p. 61-69, p. 61-62.

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